quinta-feira, 4 de novembro de 2010

Aniquilacionismo, Molinismo e o Novo Estado

Parece que o Vinícius tem tido muita dificuldade em propor um argumento cumulativo para a existência do "inferno eterno" já que tem em muito ultrapassado a coerência argumentativa. Segue-se abaixo mais um argumento apresentado:

(O aniquilacionismo) permite uma nova rebelião. Desde que os salvos tem livre-arbítrio nos céus, o que impediria uma nova rebelião na eternidade se o castigo é ausência total de sofrimento? Quando vc conhece a horrível condenação dos ímpios vc tem motivação para continuar fiel.

O mesmo pode ser descrito no seguinte silogismo:

1. Se o "inferno eterno" existir os salvos o terão como uma motivação para não pecar no novo estado;

2. Os salvos deverão possuir um grande motivo para não pecar no novo estado;

3. Logo o inferno eterno deve existir no novo estado.

Eu tenho objeções à validade da primeira premissa, mas sei perfeitamente que até mesmo se ela fosse verdadeira não implicaria necessariamente na existência de um inferno eterno. Se eu trocar a primeira premissa poderia chegar a conclusões totalmente absurdas como no exemplo abaixo:

1. Se Cérbero, o mitológico cão de múltiplas cabeças existir no novo estado os santos terão uma motivação para não pecar nele;

2. Os salvos deverão possuir um grande motivo para não pecar no novo estado;

3. Logo, Cérbero deve existir no novo estado.

A primeira premissa força a existência do inferno quando na verdade nós possuímos alternativas que não implicam na perpetuação do mal moral e que podem muito bem preencher esta lacuna.

Em segundo lugar, deve-se lembrar que o meu argumento cumulativo do aniquilacionismo afirma que a destruição dos maus é uma tese superior a do tormento eterno porque cria um mundo moralmente responsável e moralmente perfeito como uma descrição do caráter divino. O inferno não pode existir para impedir a existência do pecado, pois implica inevitavelmente na perpetuação da imoralidade. Se os pecadores sempre existirão o pecado sempre existirá.

Baseado neste raciocínio apresentado acima uma pessoa pode alegar a uma aldeia nativa onde os seus integrandes odeiam bife acebolado que no além deve existir uma sala onde os rebeldes serão obrigados a comê-lo. Se a sala existir a possibilidade de um deles pecar não será menor? Da mesma maneira não posso concluir que foi determinado funcionário de uma empresa o responsável por ter jogado o lixo para fora quando existem vários outros que poderiam fazer o mesmo.

Não concluo logicamente das premissas que os salvos possuirão uma necessidade da existência do inferno para reconhecer a superioridade da bem-aventurança sobre o velho estado e não se entregarem ao pecado. Mesmo que uma alegação semelhante venha a ser cogitada é incorreto afirmar que o único conhecimento de sofrimento que os salvos possam ter no "céu" é necessariamente um inferno de fogo. Um belo exemplo disto pode ser tirado do fato de que o estado dos salvos será antecedido por um outro repleto de sofrimentos na "Terra". Eles poderiam muito se lembrar do que sofreram ao pecar e se verem mais abertos a não deixar a Deus e o Seu plano de santidade. O inferno torna-se descartável. Sendo assim, dizer que as pessoas somente poderão servir a Deus pela eternidade se o inferno existir é um erro lógico primário.

É importante lembrar que a gritante maioria dos teólogos defende que haverá uma leve lembrança dos sofrimentos terrenos na Nova Terra. O que eles argumentam é que se nós não nos lembrarmos, pelo menos, em parte do que sofremos "aqui" devido o nosso pecado, não teremos como ser gratos a Cristo por sua morte expiatória e perdão no novo estado. Teremos segundo eles, uma lembrança leve o suficiente para não comprometer a felicidade eterna e compreensível o suficiente para servir de aviso e gerar gratidão pelo sacrifício expiatório do Filho de Deus pelos seu pecados.

Se como muitos objetam, o velho estado não poderá ser uma motivação porque não existirá mais também não poderiamos usar como motivação as experiências que tivemos em acontecimentos passados simplesmente porque não existem mais. Inteligente seria se apropriar do que fosse aproveitável "aqui" naquele eterno estado. Mesmo que esta teoria não seja verdadeira (não vejo motivos para crer nisto) a afirmação de que o inferno existe não é uma conclusão imediata disto.

Não podemos também esquecer que não devemos limitar o "estímulo" à um mero medo que os salvos possam ter na eternidade. O amor e a presença de Deus somarão aquilo que podemos chamar de "o estímulo maior". Na visão do aniquilacionismo Deus criará um mundo onde o estímulo exclusivo para a não-rebelião é o amor entre Ele e Sua Criação. Pessoas amorosas em um lugar santo não estão sujeitas à tentação que enfrentamos dia após dia. Deve-se ter em mente que estas pessoas desenvolverão o caráter divino em seu cotidiano e não possuirão aquilo que a teologia paulina chama de "corpo corruptível" estando menos sujeitas a cair em pecado.

Devemos entender que o livre-arbítrio não implica necessariamente em rebelião. Do contrário, a eternidade prometida não passaria de um mito. E que o molinismo nos oferece uma sólida alternativa ao propor uma harmonia entre o conhecimento que Deus possui do futuro, Sua Soberania e a liberdade humana. Deus poderá em Sua onisciência escolher (caso queira) pessoas que usando de sua liberdade nunca se rebelarão. Deus poderá desta maneira criar um mundo imune à rebelião sem ter que destruir a liberdade do homem de escolher, pois conhece previamante a sua escolha.

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